sexta-feira, 10 de outubro de 2008

O deus dos livros

Quando o poeta Homero escreveu a Odisséia, uma das obras mais populares de todos os tempos, seu trabalho deve ter sido enorme.
Compor e reler e percorrer cada verso foi a sua odisséia pessoal. Os tipógrafos foram meticulosos em cada página impressa, naquele tempo o papel era um artigo caríssimo e o desperdício tinha de ser minimizado.
Além do mais, não foi fácil para o autor, um velho cego, convencer os poucos os editores atenienses de que seu livro era vendável; afinal, tratava-se de um longo poema sobre um herói muito popular na época.
Mesmo assim, ele encontrou quem apostasse na obra e a publicasse.
Têm-se poucos registros da noite de lançamento; acreditam que os autógrafos foram regados a vinhos e orgias. O deus dos livros na mitologia grega (como é o nome dele, mesmo?) deve ter sido louvado com a imolação de um boi.
Hoje, a Odisséia é um fenômeno literário, traduzida para quase todas a línguas conhecidas, vendeu milhões de livros graças ao esforço de todos aqueles que acreditaram, apostaram e trabalharam no projeto. Por isso, é necessário que se tenha em mente que quando se copia um livro, está-se quebrando essa cadeia produtiva, que envolve desde o autor, ao tipógrafo, revisor, editor, além de profissionais que estão indiretamente envolvidos nesse mercado, tais como entregadores, vendedores, motoristas etc. Isso coloca em risco a produção intelectual: já que sem o dinheiro das vendas dos livros, não há como se sustentar toda essa estrutura; e as obras literárias, filosóficas estariam fadadas a nunca serem publicadas. Um mundo sem livros seria um mundo de trevas.
Essa é mais ou menos a história que as editoras parecem nos contar.
Talvez por essa razão todos saibam que "copiar um livro é crime", mas poucos sabem que os direitos de uma obra caem em domínio público 70 anos após a morte do autor.
A obra de Homero chegou a nós, graças àqueles que o copiavam. Já que ele jamais escreveu uma linha de seus poemas. Seus versos foram cantados por diversos poetas, até que fossem registrados e depois reunidos em papel. A integridade da obra original nunca fora uma preocupação, cada um que a cantou tratou de modificar aquele trecho que lhe parecia estranho ou desagradável. Tudo isso contribuiu para que a obra se tornasse um dos pilares da cultura mundial. O poeta Ezra Pound, quando perguntado sobre que obra poderia ser a obra mais fundamental da literatura, apontou a de Homero.
A literatura, a ciência ou a filosofia nunca dependeram unicamente de algum meio para fluir. Elas apenas usaram desses meios para se difundir, quando este era o mais conveniente. Por isso, devemos olhar com desconfiança tentativas de se impor um meio de propagação à qualquer obra. Se se impusesse uma proteção aos direitos autorais de Homero, resguardando ao autor a exclusividade de cantar seus próprios versos, Odisséia e Ilíada talvez tivessem morrido com o poeta.

domingo, 28 de setembro de 2008

Passeio pelo Minhocão - parte I

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Acesso pela rua da Consolação: Os primeiros metros dos 3400 m que nos levam até Largo Padre Péricles.


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Patrícia e nossos bichos indomáveis. Como eu estava na frente para tirar a foto, eles queriam vir logo. Não tenho certeza, mas acho que eles gostam quando a matilha está unida.


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Panorâmica da rua onde moro, General Jardim.


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Fachada de um prédio de escritórios. Ao que parece foi inteiramente reformado e todos os seus cômodos estão para alugar.


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Panorâmica do Largo Santa Cecília. Já passei por esse lugar diversas vezes e nunca havia notado esses Ipês. Ao fundo, há uma feira que acontece todos os domingos.

Passeio pelo Minhocão - parte II

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Fachada do Hotel Dela Rose. Perdão pelo péssimo enquadramento dessa foto. Entretanto se o fotógrafo é uma toupeira, ao menos o vermelho da fachada compensa.


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Uma das muitas fachadas de prédios em estado lastimável ao redor do Minhocão. Muitos atribuem essa desvalorização da região à construção do Elevado e, por essa razão, há um movimento pela sua demolição. Eu hoje achei o passeio tão agradável e havia tantas pessoas se divertindo, que de certa forma dá para imaginar que existe um caso de amor e ódio entre o Elevado e a população local. Durante a semana, ele é inóspito e intransitável; nos fins de semana ele é agradável e convidativo. Não sei se é pelo fato de não ser paulistano, mas é exatamente assim que eu me sinto com relação à toda a cidade: às vezes é como se fosse outra cidade durante os fins de semana.



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Mais um dos prédios vazios dos arredores. Nessa foto, se você for observador poderá me ver no reflexo de uma das janelas.


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Visão da Praça Marechal Deodoro, ao fundo a Avenida Angélica.


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Posando com meus dois cachorros (foto tirada pela Patrícia)

Passeio pelo Minhocão - parte III

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Panorâmica da praça Marechal Deodoro, onde há um playground muito sui generis. Eu particularmente não entendi esse leiaute nem esses brinquedos.


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Outra bela fachada absolutamente mal cuidada. Essa é sem dúvida nenhuma uma das mais bonitas de todo o passeio pelo Elevado. É uma pena que eu não tivesse ângulo (nem competência) para fazer uma foto melhor. Mas dá para ter uma idéia.


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Esse prédio me lembra muito o Edifício da HQ do Will Eisner. Só que esse – ao contrário dos quadrinhos – é residencial. Na sobrecapa da edição do Ensaio sobre a cegueira do José Saramago, que a Cia das Letras lançou recentemente aproveitando a onda do filme do Fernando Meirelles, esse prédio aparece no canto direito.


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Além de ter essa bela aparência parece ter apartamentos enormes.


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Prometo que no próximo passeio levarei uma câmera melhor. Essa imagens foram todas tiradas do meu celular. Por isso são tão ruins. Bom, mas acho que a lógica é bem por aí: tira-se fotos com o celular e se publica em um blog. Nesse tipo de mídia qualidade nunca é prioridade.

Passeio pelo Minhocão - parte IV

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O famoso castelinho da Rua Apa, ou menos o que sobrou dele. Construído em 1912, ele resiste ainda hoje apesar dos maus tratos. Para mim, não imagem mais perfeita de castelo mal-assombrado em São Paulo. Ali, em 1937, a família de milionário que o habitava foi encontrada morta. Pelo que se diz o "assassinato do Celso Daniel" (ou PC Farias, se preferir) dos anos trinta. A versão oficial da polícia nunca convenceu ninguém. É evidente que há muitos relatos de visões de fantasmas no lugar. Mas o que mais assusta mesmo é desmazelo da cidade para com o edifício, que hoje pertence à união (já que a família morreu sem deixar herdeiros).



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Patrícia e Ulisses caminham à minha frente.



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Geral do sobre o Elevado.



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Auto-retrato com Patrícia sobre o Elevado.


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Fim dos primeiros 3400 metros sobre o Elevado, ainda tínhamos a volta. Foto do Largo Padre Péricles, à direita a Igreja de São Geraldo (o protetor das mães e dos bebês).

Passeio pelo Minhocão - parte V, O Rapa!

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Durante o nosso passeio pelo Elevado, tivemos a surpresa de presenciar um "rapa". Esse camaradas da foto estava aí fornecendo churrasquinho de gato, água, refrigerantes e água de coco por alguns reais, quando apareceu uma viatura e, um pouco depois, um garoto gritando "O RAPA!" (com a nítida sensação de ter chegado tarde demais). Alguns conseguiram fugir carregando enormes caixas de isopor, salvando o que dava. Mas a maioria não ofereceu resistência e ficou apenas observando resignada os oficiais da prefeitura recolherem suas mercadorias.
Tudo bem que é ilegal o comércio de ambulantes sobre o Elevado. Mas a prefeitura poderia colaborar: por todo o trajeto não havia nenhum lugar (exceto esse) em que se pudesse matar a sede, do mesmo modo não havia lixeiras, o que contribuía para que pessoas atirassem lixo nas vias (eu e Patrícia passamos grande parte do trajeto carregando saquinhos de cocô de cachorro até descermos do Elevado para achar uma lixeira).
O passeio é legal e tudo mais. Mas é impressionante com a prefeitura acha que é só colocar uns cavaletes, fechar o trânsito e "plim!", está pronta uma área de lazer. Será que iria onerar muito a prefeitura colocar algumas lixeiras e habilitar alguns ambulantes a atuarem no local?
Só mesmo a carência do paulistano e a beleza decadente de nosso centrão para tornar o Minhocão viável nos fins de semana.

sábado, 20 de setembro de 2008

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Verdades e mentiras II - A alcatéia


Apesar de você já ter visto isso em algum filme (ou no RPG Werewolf), e ao contrário de lobos e humanos, lobisomens não se reúnem, não vivem nem caçam em bandos. Somos uma espécie solitária. Nosso comportamento se assemelha mais ao de ursos do que ao dos nossos parentes próximos. Essa solidão talvez seja uma conseqüência da escassez de indivíduos e da falta de sociabilidade desses. Já disse uma vez que é bem provável que já estivéssemos extintos se não nos tornássemos humanos durante o dia.
Alguns de nós são extremamente territoriais. Eu, entretanto, considero isso um tanto ridículo. E já topei com tipos que ficam rosnando ou gritando para você quando lhes invade o "território". Eles são tão patéticos que se parecem com aqueles australopithecus do filme 2001 (por favor, não se ofendam). Eu, como a maioria, prefiro vagar pela noite. Pode parecer uma perda de tempo ficar aí andando pelos matagais e plantações. Mas eu não troco por nada a sensação de deixar de ser humano e não se lembrar de seus problemas e coisas que te prendam.
É bem verdade que isso não acontece sempre. Algumas vezes, tenho alguma vingança para executar. Essas vinganças são um capítulo à parte de nossas vidas. Nas noites em que nos metamorfoseamos, saímos atrás daqueles que nos fizeram alguma mal quando estávamos em nossa forma humana (aguardem, que vou contar algumas delas aqui). Na nossa forma humana somos em geral tolerantes. Mas na forma híbrida, somos rudes, violentes e intolerantes. Então nas noites de lua cheia saímos para a desforra.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Verdades e mentiras I - Alimentação

Uma das grandes mentiras que se conta é que os lobisomens matam as pessoas para se alimentar. Em geral, não precisamos disso, nós podemos viver das coisas que comemos em nossa forma humana sem problemas. Há lobisomens, não é o meu caso, que nunca derramaram uma gota de sangue humano. A maior parte dos ataques a humanos é pelo prazer da caçada. Não me pergunte por que, mas para nós não há nada mais prazeroso e excitante do que uma caçada.
Bom, eu pessoalmente acho que caçar humanos por prazer é muito desleal. De todos os animais que já cacei os humanos são a presa mais fácil. A audição é precária, quase não são capazes de farejar nada, nunca sabem se você está ou não com medo deles e, em geral na presença de um lobisomem, entram em pânico imediatamente. Além disso são lentos, não tem garras e nem uma mordida eficiente. Quando estão amedrontados o seu cheiro é tão forte que nunca podem se esconder. Nós, lobisomens, somos capazes de sentir o cheiro de um humano a mais de cem metros de distância. É o tal negócio, se a caçada não vale a pena, não tem adrenalina e também não tem graça. Exceto quando possuem armas de fogo, porque mesmo com armas brancas humanos ainda são presas fáceis.
Por isso, essa coisa de lobisomem sair por aí comendo humanos é coisa da Sessão de Gala.

domingo, 14 de setembro de 2008

terça-feira, 27 de maio de 2008

Ensaio Sobre a Cegueira

Ao contrário do que se pensa, a metamorfose em lobisomem é muito sutil.
Filmes comumente a mostram como um evento doloroso e penoso. Mas trata-se da dramatização da coisa toda, como em geral as artes fazem com tudo (Lamentavelmente, não houve Naturalistas que escrevessem sobre lobisomens).
Entretanto, na verdade, a transformação ocorre em questão de segundos e você mal percebe. Há nisso alguns perigos. Por exemplo, quando estou metamorfoseado, procuro me isolar do convívio humano, mas às vezes é inevitável. Principalmente, quando não se percebe que deixamos a forma humana e estamos na forma híbrida homem-lobo.
Isso já me causou inúmeros problemas. Certa vez, havia-me tornado lobisomem, sem perceber. Não notei sequer as pessoas que fugiam alucinadas de mim. Foi então que, no cruzamento da Rua Augusta com Alameda Santos, alheio a todo o corre-corre que minha aparência causava um ceguinho esperava pacientemente que alguém o guiasse até o outro lado. Sem me dar conta da bagunça toda, agarrei o ceguinho pelo braço e disse: "Vamos". E assim fomos nós, sinal aberto, carros transitando freneticamente. Alguns desviando, outros freando. Por muito pouco, não atropelam o cego e a mim.
Isso me fez lembrar um dos lobisomens mais célebres que se tem notícia (não vou revelar seu nome já que a discrição faz parte do nosso código de ética). Ele teria dito: "Ora, se um cego guiar outro cego, ambos cairão na cova"http://www.bibliaonline.com.br/acf/mt/15/14+.
Devia haver várias covas abertas na região da palestina durante o primeiro século. Infelizmente, para nós, em São Paulo há e ônibus e carros por todos os lados que geralmente não tem misericórdia dos distraídos. Eles são bem mais fatais do que covas principalmente se você é um cego sendo guiado por alguém que está temporariamente cego de suas reais condições.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Clemilda!


Muitos, que vêem minha condição, perguntam se eu sofro de hipertricose. Não, eu, na verdade, sou acometido por licantropia. Adiquiri esse mal depois de estudar por muitos anos em um Liceu (uh,uh,uh... eu sempre tive vontade de fazer essa piada filológica).

Apesar de a hipertricose ser conhecida como a síndrome do lobisomem (werewolf syndrome), não é esse o mal que a maioria de nós traz no sangue. Nosso mal é perfeitamente curável, por bem ou por mal, ao contrário da hipertricose.

Além disso, alguém acometido por hipertricose pode perfeitamente conviver em sociedade. Nós, os lobisomens somos seres por demais intratáveis e ambiciosos e nosso mal é contagioso, enquanto a hipertricose é congênita.

Um dos mais notórios hipertricóticos que já viveu foi Stefan Bibrowski, nascido em 1890 em Varsóvia, Polônia. Quando tinha apenas quatro anos de idade um agente de circo alemão o descobriu. Naqueles tempos em que trabalho infantil era algo normal, ninguém achou estranho que os pais de Stefan concordassem em exibir o filho em um circo de aberrações.

Stefan foi então rebatizado como Leonel, o garoto com Cara de Leão. Ele era apresentado como um garoto que nascera daquela forma porque sua mãe havia visto o pai ser devorado por leões. Isso para as pessoas do século 19 era uma explicação bem plausível para uma pessoa ter pêlos de 10 centímetros brotando da face.

Apesar de trabalhar como aberração de circo desde a infância, dizem que Leonel era inteligente: falava cinco línguas e sonhava em trabalhar como dentista. Talvez por possuir apenas dois míseros dentes (condição comum de muitos portadores de hipertricose).

Ser peludo garantiu a Leonel conhecer o mundo, excursionou por toda a Europa e estados Unidos. Apesar de não ter crescido muito ele tinha 1 metro e sessenta centímetros, passou a ser conhecido como: Leonel, o homem com cara de leão. Às vezes confundido com Jo-Jo, cara de cachorro.

Ele se orgulhava tanto de sua pelagem que certa vez, o hotel em que ele estava se incendiou e Leonel foi o primeiro a sair de lá, seu maior temor era ter seus cabelos queimados e se tornar um homem comum como qualquer outro.

Leonel morreu aos quarenta e dois anos, dos quais 38 foram dedicados ao circo.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Ai, a bruxa vem aí. Ela não vem sozinha...

Vocês se lembram da ex-deputada federal Ângela Guadagnin do PT?

Aquela da dança da pizza. Lembrou?

Pois é. O dia 31 de outubro é um dia especial para ela. Não por que é dia das bruxas (afinal, eu não sou muito afeito ao humor fácil). Mas porque é o dia do Saci.

Hoje descobri que o nosso Roberto Carlos de ébano, que vaga pelas nossas florestas trajando apenas um barrete vermelho tem também o seu dia. E graças à Ângela Guadagnin. Acontece que a "dancing queer" é autora da lei que institui o dia 31 de outubro como o "Dia do Saci".

Ela e o deputado Aldo Rebelo estavam muito temerosos com a, cada vez mais comum, celebrações do Halloween em nossas terras. Afinal, é uma festa tradicional dos USA, aqueles malditos imperialistas, não é verdade? E, como somos umas mulas-sem-cabeça, é possível que percamos nossa identidade cultural se continuarmos a comemorar uma festa dos ianques.

Assim, resolveram resgatar o folclore brasileiro e para isso chamaram o nosso Saci.
Por que será que escolheram logo o Saci? Logo ele que é um camarada tão globalizado: fruto da combinação de tradições européias, indígenas e africanas. Dos índios veio a idéia do ser que sai da mata para assustar os viajantes, dos negros africanos ele herdou o pito (aquele cachimbo) e a capoeira e dos europeus veio o píleo (que é o gorro).

O Saci – como todos nós (alguns de nós, na verdade), que sempre foi um cidadão aberto a outras culturas –, talvez achasse graça da preocupação dos deputados que o elegeram salvador do folclore brasileiro do imperialismo norte-americano. É possível que se animasse a fazer uma traquinagem. Quem sabe desse um sumiço nos R$ 425,95 mil que o deputado João Magno (amigo de Guadagnin) recebeu das contas de Marcos Valério. Ou ainda usasse de sua única perna para passar uma rasteira em Guadagnin, quando ela passasse toda sacolejante entre as mesas dos deputados comemorando a absolvição de seu amigo?

Não estou indignado porque não existe o dia do lobisomem. Para nós, dor de cotovelos tem outro sentido. Além do mais, o dia do lobisomem é o dia em que você encontra com um. Espere e verá.

Que o meu amigo Saci tenha o seu dia, nada contra. Mas não deixa de ser engraçado que, ainda hoje, o Halloween cause pânico a alguém.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Som e fúria

Mesmo depois de o Positivismo ter entrado para a história da filosofia, de ter milhões de objeções relacionadas à lógica e à filosofia da linguagem, eu ainda fico maravilhado ao descobrir uma Lei Natural.

Essa lei está baseada em duas grandezas inversamente proporcionais, i. e.: quando uma delas aumenta, a outra diminui na mesma proporção, ou, na diminuição de uma a outra aumenta em igual proporção.

Não me levem a sério, por favor, mas a lei natural que descobri é: a potência do aparelho de som do carro é inversamente proporcional à qualidade do seu gosto musical.

A constatação é empírica! Você se lembra de alguma vez ter passado por alguém ouvido Bach no último volume enquanto guiava um veículo cercado de alto-falantes por todos os lados? Claro que não. O repertório dessas figuras é sempre o pagode da pior espécie, o funk mais badalado do momento ou o putz-putz mais insuportável, isso quando evidentemente não é o hino do clube de futebol do infeliz.

Ok. Eu estou sendo preconceituoso. Mas que lobisomem não o é? Eu não tenho nada com o gosto musical das pessoas. Além do mais gosto musical não pode ser mensurado na mesma proporção que potência de um som (essa sim, uma medida).

Entretanto, se você liga o seu aparelho de som e escuta suas musiquinhas a volume saudável, o suficiente para permitir que o seu vizinho tenha uma vida própria, isso é problema seu. Aí pouco me importa se você ouve Beethoven ou Alexandre Pires. Agora, se você sai na rua esfregando o seu gosto musical nos tímpanos dos outros, esteja preparado para as críticas.


quinta-feira, 1 de maio de 2008

Bonzo Goes To Bitburg

Eu sempre gostei dessa música dos Ramones. Mas o que mais me agradou nela sempre foi o refrãozinho bem bonitinho: "No no-no-no, my brain is hanging upside down/ No no-no-no, I need something to slow me down" (que rimava down com, ora vejam, down). Eu sempre a cantei como uma canção sobre sair e arrumar algo para aliviar as suas preocupações do dia-a-dia.

Dia desses, com a música na cabeça (sempre o refrãozinho: No no-no-no, my brain is hanging upside down...), fui procurar a musiquinha na minha discografia dos Ramones. Foi quando percebi que o nome da música tinha um parêntesis (Bonzo Goes To Bitburg). Quem diabos é o Bonzo? E onde diabos é Bitburg?

Vamos à historinha da música:

Joey Ramone começou a escrever essa música em desagravo à visita do então presidente dos EUA Ronald Reagan ao cemitério em Bitburg, Alemanha Ocidental. Joey era judeu e teria ficado ofendido por Regan visitar um cemitério onde estavam enterrados vários membros da SS, além de outros Nazistas que haviam praticado atrocidades em campos de concentração, inclusive de terem assassinado prisioneiros de guerra estadunidense. A visita foi muito criticada nos EUA, tanto que o assessor de imprensa de Regan, Donald Regan, se defendeu dizendo que a maioria dos soldados enterrados ali eram apenas alemães mortos na Segunda Guerra Mundial, que nem sempre compartilhavam das idéias do nazismo.

O Sílvio Santos (que é meu leitor) a essa hora já está se perguntado: "- E o bonzo?" Bonzo era o mome de um chimpanzé do filme estrelado por Regan em 1951, Bedtime for Bonzo. Regan interpreta o Professor Peter Boyd, um estudioso que tenta ensinar a moral humana ao chimpanzé Bonzo. Para tanto, resolve simular uma família típica norte-americana com ele mesmo fazendo as vezes do pai e Jane Linden (interpretada por Diana Lynn) fazendo o papel de mãe. O filme teve ainda uma continuação sem Regan: Bonzo vai à faculdade).

Johnny Ramone, que era Republicano e apoiava Regan, não quis que o título da música fizesse referência, mesmo que indireta, à Regan e pediu que o nome da música fosse o refrãozinho: "My Brain Is Hanging Upside Down", por insistência dos outros membros da banda, o título original ficou entre parêntesis.

Quadrinhas de versos livre de Edna Cappanema

O Sexo.
Sim, era uma mulher frígida.
Mas, também, pudera...
Quando embrião
Passara seis meses congelada.

O Verão.
O Sol do Leste encontrou o Sol d’Oeste
E enquanto conversaram,
Trocando suas fofocas
Torraram a cabeça de todos os passantes.

O Nosferato.
A murissoca zumbinduivava pelas noites.
Chupava o sangue das vítimas
E antes do galo cantar
Voltava para o seu caixão.

O Tesão.
Só mesmo o Sr. Bombeiro, mangueira à mão,
Era capaz de apagar
Todo o fogo que havia
No convento Madre Clélia.

Edna Cappanema.

São Paulo, 13 de agosto de 1997

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Plano encruzilhado

Há 22 anos, eu saí da escola em que estudava e, no caminho de casa, parei para comprar um picolé no carrinho de sorvetes que ficava em frente ao portão da minha escola. O dono do ponto era um tal Pereira – seu Pereira para ser mais exato –, um indivíduo que fazia ponto na porta do Colégio Diocesano de Itumbiara, no interior de Goiás (onde passei grande parte da minha infância). O seu Pereira vendia picolés, laranjas e cajamangas verdes com sal aos alunos e pais durante as entradas e saídas dos três períodos letivos do colégio.

Naqueles tempos de inflação galopante, era comum perguntar o preço até das coisas que você comprava usualmente. Não se dizia "quanto custa tal coisa", mas sim: "Quanto está o tal coisa". Era uma época em que, mesmo as pessoas mais simples que viviam do comércio tinha de calcular por quanto deveriam vender suas mercadorias, e, por mais simples e modestas que fossem tinham de determinar diariamente, quanto iriam custar as suas mercadorias. É óbvio que poucos, diria pouquíssimo, abriam os jornais para saber o índice de inflação e assim recalcular os seus preços. O seu Pereira tinha um procedimento bem singular, e não era diferente da maioria dos pequenos comerciantes. Se perguntávamos: "– Quanto está o picolé, seu Pereira". Ele nos dizia: "dois mil e quinhentos cruzeiros". Se alguém respondesse: - 'Está caro!' Ele imediatamente recalculava e dizia: "Então, dois mil e duzentos cruzeiros".

Por que eu resolvi trazer o seu Pereira das trevas mais profundas da minha memória. E foi justamente o seu Pereira o primeiro a me comunicar que de 28 de fevereiro de 1986, em diante a nossa moeda deixava de ser o Cruzeiro e se chamaria Cruzado. Naquela minha cabeça de moleque a moeda de um país era algo tão imutável, quanto a bandeira e o hino. Pensei tratar-se de mais uma de suas costumeiras gracetas do meu fornecedor de picolés. Não me fiz de rogado, peguei as duas notas de mil cruzeiros e as entreguei "cruzadas" para o seu Pereira.

Como podem ver, tudo na minha infâncai já prenunciava que eu seria um lobisomem.

I Was a Teenage Werewolf

Responda rápido:

O que tem em comum os Rolling Stones, David Bowie, Muhammad Ali, Emerson Fittipaldi, Robert Redford e Harrison Ford?

Isso mesmo. Todos eles são idosos.

Não, não estou falando mal de ninguém, nem tirando sarro. Tecnicamente, idoso (pela legislação brasileira) é aquele camarada que já deu sessenta ou mais voltinhas ao redor do Sol.

Se tudo correr bem, ao se tornar idoso, você passa a ter o privilégio de ter vaga marcada em shoppings e supermercados, não entrar nunca em filas, de ter assento reservado em transporte público, e poder descer pela porta da frente (sem pagar); você vai receber receber um salário e poder ficar em casa sem trabalhae.

Fantástico, não? É quase como ter uma Carteirinha de Sapo, que funciona de verdade. E muitas pessoas ainda estão no auge, vejam, por exemplo, nossos governadores e presidente.

Ok. Eu sei que não é bem assim. Que em alguns casos a velhice é algo bem melancólico e que há muito pouco respeito com o idoso em nossos dias. Envelhecer nesse país é uma tarefa árdua e heróica. Contudo há uma única alternativa para o envelhecimento, que, diga-se de passagem, é bem pior.

E não se esqueça, se você por um acaso estiver em um transporte público e de repente subir o Ozzy Osbourne, levante-se de dê seu lugar ao vovô.

Não joga nem no Madureira

Uma marca de refrigerante (Coca-Cola, pô) resolveu fazer uma campanha que compara o Maradona ao Biro-Biro. Acho bem interessante que não tenham escolhido Pelé, Ronaldinho Firula, Garrincha - escolhas óbvias mas nem sempre possíveis (e especificamente no caso do Ronaldinho Firula: IMPOSSÍVEL).

Por incrível que pareça, essas comparações são feitas com freqüência. Eu já vi comentaristas profissionais de futebol das maiores emissoras de tevê do país comparando Maradona a esses jogadores brasileiros que ficam concorrendo (às vezes até vencendo) eleição de melhor do mundo segundo Fifa. Que os caras são bons jogadores, isso não se discute. Mas compará-los ao Maradona é puro pachequismo pedante, cheio de pretenções, feito por comentaristas com propensão para a polêmica, e que são, sobretudo (e essa característica é a única imperdoável), maus profissionais. Antes de tudo, quero dizer que ser polêmico não é nem nunca foi uma qualidade. Se fosse, só teríamos comentaristas esportivos de qualidades enormes. Desde que me entendo por gente, é comum o menosprezo da crônica esportiva brasileira pelos jogadores estrangeiros, acima de tudo pelos craques.


Tudo isso para enaltecer o futebol e os jogadores brasileiros. Sempre que aparece um gringo bom de bola que a imprensa mundial começava a elogiar. Nossos comentaristas com uma colossal dor de cotovelo bradavam "- Shevchenko, o quê! Esse não joga neeem no Madureira". Penso que talvez seja por essa razão que o nosso querido, imortal Madureira nunca tenha tido um grande time. Lá não joga nem o Shevchenko, nem o Ballack, nem Henry, nem o Zidane e nem toda a sorte de craques de futebol infelizes que deram o "azar" de não nascer nesta terra. O Biro Biro, pobre coitado, foi vítima constante dessas comparações: "Esse tal de Rummenigge não dá meio Biro Biro".


Fazer isso com bom humor, como a Coca-Cola, é legal. Afinal, a piada não respeita praticamente nada (Padre Adelir que o diga). Mas fazer isso a sério, como já vi, é imperdoável.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Quando surge a lua cheia, o lobisomem mata!

Nos anos 1970, a Marvel lançou uma série de revista com o personagem Werewolf by night (Lobisomem na noite). Nunca soube se essa série chegou a ser lançada no Brasil, mas nos EUA ela teve 43 edições, cinco em formato gigante e o personagem foi retomado nos anos 1990 para mais cinco edições.

O Werewolf vinha na esteira do sucesso do Hulk. Basicamente, ele vivia o mesmo drama entre humanidade e bestialidade. O humano em questão era o inglês Jack Russell, herdeiro de um baronato e da maldição da licantropia. Russell, assim como Bruce Banner, vivia em busca de uma cura para o seu mal e nesse ínterim vivia grandes aventuras. Apesar da sua bestialidade, Russell nunca tirou a vida de ninguém e sua metamorfose em lobisomem acontecia de duas formas: 1. voluntária, que acontecia quando ele se concentrava e se tornava num hibrido entre humano e lobo, que entretanto guardava a forma mais humana, nessa maneira ele mantinha suas funções cognitivas e sua consciência, além de adquirir uma superforça, olfato desenvolvido e audição extremamente apurada. 2. Durante a lua cheia, ele perdia suas funções cognitivas, seu lado fera comandava suas ações; ele se tornava então uma criatura superpoderosa e totalmente fora de controle.

Havia uma heroína na história. A irmã de Jack Russesll, Lissa. Ela tentava curar o irmão e convencer as pessoas de que seu irmão apesar da aparência bestial era um amor de pessoa. No fim, ela era sempre vítima dos vilões e sobrava para o irmão sempre a tarefa de salvá-la.

O barbeiro e o lobisomem

Cadeira de barbeiro (volume I)
Neste espaço reproduzo as conversas que tenho com o meu barbeiro. Ele é uma pessoa simples e em geral direta.
I

Barbeiro - Quem o sr. acha que matou a menina lá?

Lobisomem - Que menina lá?

Barbeiro - Aquela que os pais jogaram do prédio.


II

Barbeiro - Como é que um lobisomem pode ser ateu?Lobisomem - O que tem uma coisa a ver com a outra?

Barbeiro - O sr. me desculpe, mas estou falando com um homem que nas noites de lua cheia se transforma em uma criatura meio lobo meio homem. se uma coisa fantástica e sobrenatural como o sr. pode existir, então é porque existe algo além da nossa compreensão. Bom, eu penso assim.

Lobisomem - Primeiro, a existência de lobisomem não pode ser prova para a existência de Deus. A existência de lobisomem só serve de prova para a existência de lobisomem. Segundo, existem diversas coisas que estão além de nossa compreensão. Isso também não prova a existência de nada, só prova que nós ainda não compreendemos bem algumas coisas.

...é mentira mesmo

Certa vez, um amigo meu...

Dizem que quando começamos a contar uma coisa assim é por que é mentira.

Como não quero entrar nesse mérito, já vou assumir de antemão que é mentira mesmo.

Bom, vamos ao que interessa:

Certa vez um amigo meu passava ali pelo joquei clube - voltando da USP, dizia ele - quando de repente um Mitsubishi Eclipse acerta em cheio a traseira do seu carro. Meio transtornado, ele se levanta, sai do carro para ver o que aconteceu. Do Eclipse sai de um lado um camarada baixinho, meio calvo ainda meio tonto. Do outro lado, sai uma travecão de quase dois metros... Meu amigo disse que o negócio até parecia um Transformer saindo de dentro daquele carrinho.

O carinha se despede do traveco - que segue seu rumo - e vai tratar da batida. A certa altura ele liga para alguém e narra o que aconteceu (omitindo é claro o "pequeno" detalhe. Enquanto esperam o guincho, o camarada chega para o meu amigo e diz que não sabia que se tratava de um traveco, imagina. Que ele tinha ficado tão transtornado quando descobriu que nem vira o carro do meu amigo.

- Desculpe-me. Mas isso não me interessa. Se o sr. me pagar o prejuizo, está tudo bem.
- Pode ficar tranquilo. disse o homem.

Pouco depois o meu amigo percebeu a razão dessa desculpa em tom de confissão: Chegaram em um outro carro, a esposa e a filha de seis anos do condutor do Eclipse.

"- Se ele não viu que o indivíduo era um traveco, é claro que ele não iria ver um carro na frente dele. Tenho dúvidas se ele é capaz sequer de ver o volante do próprio carro" - dizia o meu amigo depois.

Bom, por que será que estou falando nesse assunto?

Claro! Ontem o Ronaldo Fenômeno foi pego com três travestis (se fosse o Romário seria uma piada pronta vê-lo pronunciar "três travestis"). Mas o melhor foi a desculpa. O Fenômeno não sabia que se tratavam de travecos. Essa virou a desculpa padrão. Basta ser flagrado com baton na cueca que camarada já solta um "NÃO SABIA".

Até tu, Fenômeno.